Sentei-me ao Sol, sob o Sol, sob a nuvem que tapou este Sol, sento-me e no meio das minhas pernas sob o meu olhar, encontro uma abelha morta na beira metálica deste assento vermelho, com os dedos empurro-a rumo ao chão, sem interesse pelo gesto prossigo nas minhas confusões que são apenas paciências, nós, alguns muito cirúrgicos até satisfazem ao olhar tal obra, mas é necessário. Este barco sob o Sol não conseguirá fazer-se ao Mar…continuando com estas amarras…o Sol incide, ilumina o chão, ali uma formiga encontrou a abelha defunta e após algumas tentativas de a levar às costas decidiu ser melhor leva-la ao colo, ainda a vejo, já distante do começo, vai, como quem leva nos braços livros, certa mas cuidadosa, já não a vejo mas continuamos, eu, a formiga, o assento, a abelha, a lagartixa sem rabo que me espiou à momentos e mergulhou por entre os buracos deste assento vermelho. Volto-me para os nós, alguns teimosos em não querer, outros deslizam sob os meus movimentos, soltando-se com a pressão, como quem solta os cabelos. Paro e não reconheço quase nada, tudo mudou em prol de palavras passadas, nem mesmo a verdade se serve nem a mentira quer já comer, em mim gera-se a revolta, o povo está exaltado no seu silêncio e quer saber se morre pelas suas escolhas ou se o farão essas mentes com iras, não há nada para se perder…quando assim já se sabe o que se tem e o que nos alimenta, não chega comer tem de ser comida, vivida e participar na sua morte, ali ao canto sob o Sol um som cadenciado com intervalos de ajuste de trajectória, está um Gafanhoto a pular para subir aquela parede impossível, ele no entanto pondera estas investidas a uma coisa que à partida já parece decidida, acho que o ouço dizer:
- Tu que estás ai e me olhas sob o mesmo Sol perguntas-te para que faço o que faço?!
Sou um Gafanhoto, pulo e mesmo sabendo que posso morrer aqui ao canto sob estas folhas castanhas a lembrar o que são memórias, faço, pois assim o consigo, não interessa falhar ou acertar, ambos são esforços, intenções, haverá pois a cadência dos sucedidos e aconteceres, haverá assim após o sucesso ou falhanço uma outra carta branca por escrever.
-Sou Gafanhoto e este canto talvez o meu caixão será até então o meu caminho opcional, eu sei que é pulo grande, talvez nunca o consiga, mas já o vi, já o tive, já dei o tal pulo de saída e já te vi lá em baixo sob o mesmo Sol que nos aviva o viver, a escrever e vejo-te também a um canto, a um outro canto a pular como eu e nada te digo sobre o que fazeres, faço o mesmo que tu, tu o mesmo que eu, o que importa é respirarmos como caminho as nossas escolhas.
Em 1978
Há 6 anos